terça-feira, 26 de outubro de 2010

O relógio da vida

Naquela tarde de sol, calor de dezembro, assim que entrei na escola e me dirigi ao pátio para levar minha turma até a sala de aula, fui rodeada pelos alunos, que tinham os olhos ainda mais risonhos do que de costume. Todos, com canetas nas mãos e um brilho que teimava não deixar o canto dos lábios, pediam que eu assinasse as camisetas “para guardar de recordação, professora!” – ainda que não tenham aprendido exatamente o significado dessa palavra.
Bastou meus olhos abraçarem essa cena para o coração conversar com a memória e dias bons - muito bons! - tomarem conta da alma.
Fim do ano, alívio pela aprovação, alegria anunciando as férias na praia com a família e o gostinho de saudade dos dias que foram embora e dos amigos que pareciam ser eternos. Fim do ano anunciando a chegada sorrateira do outro, quando novamente atravessaria o tempo entremeado de leituras, provas, estudos, jogos, histórias, Maristelas, Marios, Monicas, Cleusas, Claudecenes e Gerusas.
É exatamente aí que entra o rito de passagem: assinatura de camisetas, amigo secreto (não tão secreto assim), choro, boletins, alegria com pitadinha de tristeza e, claro, dúzias e dúzias de ovos espatifados nas cabeleiras, marcando cada fatia do meu tempo de escola.
Naquela tarde de sol, calor de dezembro, olhei para os meus alunos e vi no espelho da alma que tudo mudou. Não sei bem em que momento o ponteiro correu no relógio da vida e passei a assinar “Um beijo, profª” nas camisetas. Mas! Não, nada mudou. Um novo século foi anunciado, mas no tempo zombador e perspicaz, muitos dos ritos permanecem. Assinei camisetas, entreguei boletins, bracinhos circundaram meu pescoço, beijos estalaram em minha face, olhos sorriram um tanto marejados, a palavra “saudade” uniu presente e passado... E saí da escola pisando em ovos - ou no que sobrou deles.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Professores de minha vida

Aos 5 anos pisei no chão da escola pela primeira vez. Não lembro do rosto de minha professora, mas suas mãos estão vivas em minha memória, abrindo minha garrafinha de suco da Turma da Mônica - eu nunca conseguia abrir sozinha!
Poucos anos depois, na casa de madeira, a tia Rosi mostrava a cortina da sala de aula e explicava: "o substantivo composto tem duas palavras, igual a barra dessa cortina, que é dupla". A tia Cláudia queria sempre ver minha letra maior... E pra isso, fiz muitas folhas do caderno de caligrafia. (Sim, minha letra aumentou!)
Terminei a 4ª série, mudei de escola, e continuei aprendendo, aprendendo. Na escola dos meus sonhos, fiz teatro com a Claudecene, aprendi a ver os ipês florescerem com a Maria Helena, li grandes autores - sem saber disso - com a Gerusa, gostei dos números (incrível!) com a Lilian, conheci uma amiga-mais-que-professora na Florise.
Mais uma etapa encerrada. Adentrei pelos portões do IEP. Novas boas surpresas. Compromisso com a educação, vontade de ensinar, formação crítica e uma professora que ficou na história: Cleusa querida, Cleusa dos beijos históricos, Cleusa da Lapa!
Escolhi meu caminho, entrei definitivamente para as letras - acho que sempre gostei disso -, descobri a linguística e a literatura. Conheci o Vinicius espiritualista com o Édison, descobri o rei da França calvo com o Borges, decidi que iria para a Espanha nas aulas da Terumi.
Caminhando mais um pouco no tempo, conheci as múltiplas linguagens, o afeto, os acervos e a magia de formar leitores com um trio fantástico: Marta-do-olhar-firme, Nancy-que-sorri-com-os-olhos e Eliana-da-voz-doce.
Um pouco disso tudo tempera meu eu-professora. Foram por essas mãos ternas, firmes, muitas vezes exigentes, que me tornei... eu! E por isso, o meu profundo agradecimento e a minha eterna admiração, mestres queridos!

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Bienal do Livro do Paraná

Início da noite, Bienal do Livro do Paraná. Depois de enfrentar um trânsito típico das 6, encontrar alunos e amigos que têm em comum o amor pela literatura acaba com qualquer mau humor.
Num ambiente aconchegante - um café literário -, Cristóvão Tezza e José Castello discutem o processo de criação literária, as vozes do romance, o livro e o leitor. Ouvir palavras apaixonadas e ver olhos brilhando na sala cheia (é uma maravilha ver filas para entrar em palestras literárias) afirmam o importante espaço da literatura na sociedade.
Fica aqui, portanto, o elogio ao evento e aos autores da noite de hoje e também a mesma crítica feita à Bienal de Curitiba que aconteceu no ano passado: o excesso de livros comerciais e falta de novidades nas estantes das editoras presentes que, aliás, eram todas locais.